Leonardo Boff – no início, “o socialismo era de vertente cristã”

Leonardo Boff escreveu: “inicialmente, o socialismo era de vertente cristã”.

No semanário “Pasquim21”, de 2002, há uma entrevista com Leonardo Boff, onde este expõe as origens religiosas do socialismo:

Jesus – Não estaria nascendo um novo paradigma socialista no século XXI apoiado no cristianismo? Não estou falando das Igrejas, mas da proposta social de Cristo, que foi afastada da sociedade pela Revolução Francesa, exilada no plano da religião

Boff – Eu acho que uma das forças, entre tantas que existem, de retomar o discurso socialista vem dos grupos cristãos. Inicialmente, o socialismo era de vertente cristã. Os primeiros socialistas aqui do Brasil eram os jesuítas.

Eles foram para as cortes e explicaram o seu ensaio comunista e socialista. Eram todos socialistas, tanto é que Marx dialoga e discute com o socialismo utópico, que é o socialismo religioso, e funda o socialismo científico, o socialismo como estratégia de análise da sociedade, como montagem de uma força histórica alternativa para derrubar o capitalismo e que acabou condenando o socialismo utópico como não viável. Hoje nós entendemos que os dois se completam. O socialismo utópico apresenta horizonte maior, uma sociedade aberta, radicalmente democrática – porque o socialismo é a democracia integral, na política, nas eleições, na economia (com a socialização dos meios de produção), na cultura (com acesso ao Eros, ao prazer, à diversão, à arte). Esse é o horizonte utópico. Resgatar a tradição religiosa, de onde nasceu o socialismo, incorporando o socialismo histórico dos franceses, dos italianos, com as experiências boas do leste (eles criaram todo um senso de solidariedade, que foi perdido para a nova configuração de socialismo), é o grande sonho das periferias do mundo

Jesus – Eu acho que esse novo paradigma deve nascer das comunidades analfabetas, porque elas não estão comprometidas com esse paradigma iluminista que está aí.

Boff – Exatamente. Eu acho que nós teremos condenado o socialismo não porque queremos. Ou nós socializamos os recursos escassos que temos na Terra: água, energia fóssil, alimentação ou não chegamos a lugar algum. Nós queremos criar o modelo adequado, o processo de globalização onde as tribos da Terra se encontram em um único lugar (que é o próprio planeta). Ou nós repartimos, socializamos, criamos a Federação dos Povos da Terra e a república mundial, igualitária, socialista, ou então caímos na versão vigente hoje, que é o modelo que Locke já bolou, na visão de uma superpotência, com mão fechada, que se impõe a todas as demais e as alinha com sua estratégia”.

Minhas humildes considerações – o socialismo, como democracia radical (a extensão da democracia política à economia, às unidades produtivas, à cultura, às estruturas sociais, estabelecendo o poder do povo em todas as relações e instâncias), é, basicamente, a mesma concepção de um Betinho (um dos líderes da A.P. na década de 60), de Henfil, Frei Betto, Boaventura de Sousa Santos, Clodovis Boff e outros.

As raízes deste socialismo são bíblicas e científicas, estão nos Santos Padres, tal como em Buchez, Lamennais, Ozanam, Sangnier, Simone Weil, o Clarté, Mounier, Alceu e outros autores.

As idéias de Leonardo Boff coincidem com as idéias fundamentais expostas neste blog, abonam as afirmativas com sua autoridade intelectual e moral e seus bons argumentos.