O ideal de Democracia popular, de economia mista, no núcleo das ideias cristãs socializantes

O livro do padre Cavallera, “Doctrine sociale catholique”, 1933, rejeita claramente o liberalismo econômico, o capitalismo privado, o capitalismo estatal, a estatização geral da economia com controle centralizado e burocrático (o capitalismo de Estado). Juntando as negativas e unindo os pontos positivos conexos, a figura que aparece são as linhas gerais de um modelo de socialismo participativo, de uma boa democracia popular com economia mista, ainda que o padre Cavallera não usasse o termo “socialista” (o mesmo vale para os textos de Pesch).

Milhares de escritores religiosos criticaram o liberalismo econômico e defenderam um sistema misto de distributismo e socialismo humanista, sem grandes propriedades privadas, sem imperalismo, sem latifúndios, sem usura etc.

O distributismo foi criado, com este nome, por Chesterton, lá por 1920, como alternativa ao capitalismo (privatizar tudo) e estatizar tudo, como um modelo misto, de economia mista. 

O distributismo, que faz parte essencial da Doutrina social da Igreja, teve outro mérito, segundo van Gestel, “chega à conclusão de que o contrato de trabalho consagra sempre um estado de dependência”, de ASSIMETRIA, que não é benéfico. Por isso, os distributistas defenderam um sistema econômico que combina o regime cooperativo, a propriedade comunitária, a pública controlada pela sociedade, formas de planejamento participativo e a difusão da pequena propriedade limitada pelo bem comum (moradias, renda cidadã, carros populares etc).

Chesterton, Belloc, Kothen, o próprio van Gestel, Alceu Amoroso Lima e outros seguiram esta linha.

Charles Péguy, Bergson, Georges Renard o. p. (1876-1943), Marc Sangnier (1873-1950), Emanuel Mounier (1905-1950), padre M. D. Chenu O.P, Giuseppe Toniolo, Jacques Maritain, o padre Luigi Sturzo, Gilbert Keith Cresterton (1874-1936), Hillaire Belloc, Cristopher Dawson, Francis Pakenham (que trabalhou com Beveridge), padre Gustavo Gutierrez, padre Inácio de Ellacuria, padre Camilo Torres, padre Moltman, padre Metz, Ernst Bloch, Dom Hélder Câmara, Dom Tomás Balduíno e Dom Pedro Casaldáliga são provas claras da preferência por modelos socializantes de socialismo participativo e comunitário.

Mounier foi profundamente influenciado por Georges Renard e por Charles Péguy.

Mounier fundou, em 1932, a revista Esprit (Espírito), combatendo a reificação das pessoas. Defendeu a aliança com os socialistas e comunistas etc. Na Resistência Francesa, os católicos, comunistas e socialistas trabalharam juntos, elaborando programas comuns de fundo socializante. Jorge Amado sempre elogiou esta participação e, representando o PCB, propôs a Alceu a política de mãos estendidas (apertar as mãos do próximo).

A Resistência Francesa foi liderada por um católico, chamado Georges Bidault, que foi importante em sua época, contra o nazismo. Depois, não aceitou os planos do grande católico De Gaulle, para a independência da Argélia. Georges Bidault veio, refugiado, para o Brasil,no final da vida, ficando aqui, por vários anos, nos anos 60 e 70, já bem velho, como Bernanos tinha ficado. Mesmo com seus erros no final da vida, Bidault, ao liderar a Resistência Francesa, mostrou a presença católica na Resistência, pois esta tinha como líder um católico, que, na época, era progressista. 

O padre José Maria Díez Alegria S.J. também defendeu uma forma de socialismo democrático e participativo. Este jesuíta defendeu a socialização, atacou duramente o culto sacrílego ao “capital idolatrado” e escreveu que “reconhecendo a dignidade do trabalho e do trabalhador, colocamos o problema de estabelecer na sociedade estruturas dentro das quais sejam plenamente reconhecidos e assegurados os direitos inerentes a essa dignidade do homem que trabalha”. Maritain defendeu basicamente as mesmas idéias.

O padre Gonzáles Ruiz escreveu, lá por 1965/1966, as frases seguintes:

… o segundo nível no qual se deve desenvolver o diálogo católico-marxista é o terreno sociológico, intimamente ligado ao campo religioso: o sentido humano do trabalho, a condenação do sistema capitalista, a supressão das classes privilegiadas, a construção do socialismo. (...)

A posição, portanto, da Igreja como tal, frente ao socialismo, é de estimular claramente os cristãos a criar o caminho que conduza mais eficazmente a essas situações de superação da estrutura da “exploração institucionalizada”, isso é, do capitalismo”.

O livro “O evangelho segundo Marx” de J.º de Meira Penna , é uma distorção liberal e de má fé sobre a teologia da libertação. Prova, novamente, o ódio liberal aos elementos revolucionários e socializantes do cristianismo, que são essenciais e intrínsecos (anticapitalistas, antiimperialistas e anti-latifundiários).

Alguns escritores da corrente do “socialismo religioso” ilustram a tese acima sobre a presença cristã nas origens e durante o movimento socialista: Leonhard Ragaz, G. Wunsch, E. Tillich, o Pastor E. Paasy, Roland Holst, W. Banning, H. Mertens, O. Bauer e boa parte do trabalhismo inglês.

Como ensinou Van Gestel, o livro do ministro trabalhista Snowder, “Labour and the New Word” é uma prova clara da permanência das raízes religiosas no trabalhismo inglês.