Rui Barbosa, grande católico, ligado a doutrina social da Igreja

Os textos de Leão XIII e de vários expoentes da doutrina social da Igreja (Tocqueville, Acton, Gibbons e outros) levaram Rui Barbosa ao retorno da prática do catolicismo. Rui Barbosa (1849-1923), um dos grandes juristas do Brasil, nunca foi ateu. Sempre professou a fé católica, mas no início de seus vinte e pouco anos, nos anos 70 do século XIX, tornou-se anticlerical. Isto ocorreu por influência do teísta Saldanha Marinho, que nunca foi ateu, tendo religiosidade, mas, por erros, era anticlerical.

Após amadurecer, Rui reencontrou o bom caminho, reconciliou-se com a Igreja e defendeu, na campanha civilista, em 1919, a “democracia social” da Igreja, exposta nos textos de cardeais como Mercier e Gibbon.

Em 1918, o padre jesuíta Antônio Ferreira escreveu “Ruy Barbosa em face da religião” (Bahia, Livraria Catilina, 1918), fazendo uma apologia da religiosidade de Rui Barbosa, que concorreria à Presidência, em 1919. No livro, há o elogio público a Rui, da lavra do Cardeal Joaquim Arcoverde (1850-1930), em 11.08.1918. Arcoverde era o Primaz dentre os bispos e nosso único cardeal. Foi o primeiro cardeal latino-americano e nomeado Arcebispo do Rio de Janeiro em 1897, por Leão XIII. Arcoverde criou a Federação das Associações Católicas. Vários bispos da Igreja elogiaram Rui, a começar por Dom Antônio de Macedo Costa, expoente da Igreja no atrito contra a maçonaria, em 1875, que tinha sido professor de Rui Barbosa. 

O sucessor do Cardeal Arcoverde foi o grande Cardeal Sebastião Lemes (1882-1942), que teve participação ativa na Revolução de 1930 e apoiou as reformas sociais e nacionalistas de Getúlio Vargas. O Cardeal Sebastião Leme foi nosso segundo cardeal, dando todo apoio a Alceu Amoroso Lima e Dom Hélder Câmara. Dom Sebastião deu todo apoio às reformas sociais feitas por Getúlio Vargas. 

O “civilismo” de Rui (e de Olavo Bilac), especialmente a rejeição do militarismo e a busca do aprofundamento da democracia e de reformas sociais (cf. João Mangabeira), era também o credo do jovem Alceu Amoroso Lima. Alceu foi ligado ao movimento “Clarté”, em busca de uma democracia social. Rui declarou, na campanha para a Presidência: “estou com a democracia social”, a “democracia social” preconizada pelo “Cardeal Mercier”, “democracia ampla, serena, leal, e, numa palavra, cristã”.

Alceu elogiou o movimento civilista de Rui, escrevendo: “Rui foi o primeiro candidato a lançar, ainda que timidamente, a defesa das idéias democráticas e sociais”. Numa entrevista à revista “Veja”, em 08.12.1982, Alceu disse “defino-me como um socialista pluralista”, uma frase que mostra a linha de continuidade entre o ancião Alceu e o jovem Alceu. Pontes de Miranda foi outro grande católico e socialista democrático. 

No Brasil, houve também uma convergência entre católicos e alguns positivistas contra o militarismo, como fica claro nas seguintes obras: “Faustos da ditadura militar”, de Eduardo Prado; “Contra o militarismo” (1910), de Rui Barbosa; “Militarismo e política moderna”, de Teixeira Mendes; “O advento da ditadura militar”, do Visconde de Ouro Preto; e a ação dos Maragatos de Gaspar Silveira, tentando reconstruir o parlamentarismo brasileiro. No fundo, como explicou Dalmo Dallari, o sistema mais eficiente para o controle popular seria um presidencialismo parlamentarista, um sistema misto, nos moldes franceses, da lavra de De Gaulle, com economia mista, recall, plebiscitos, referendos, vedação completa de recursos de empresas nas campanhas políticas etc.

Eça de Queiroz também foi influenciado pelos textos de Leão XIII. Eça redigiu, no início de sua vida literária, alguns textos bem torpes, embora mesclados com boas críticas sociais. No entanto, Eça teve uma boa morte (a melhor morte é morrer por uma boa causa), repetindo as orações que sua esposa fazia. Quando ficou maduro, redigiu também várias biografias de santos nos últimos anos de sua vida. Eça elogiou o humanismo de Leão XIII e o “socialismo cristão”.

O católico anti-imperialista, Eduardo Prado, foi uma das pessoas que auxiliaram a caminhada de Eça de Queiroz, aparecendo como “Jacinto”, no livro “A cidade e as serras”, de Eça. O socialismo cooperativista e religioso de Antero de Quental também é bastante conhecido e faz parte da renascença espiritual, em Portugal, um movimento que também ocorreu no Brasil. Este movimento tinha, em seu bojo, uma resistência cristã ao capitalismo e a busca de uma democracia social, uma democracia popular.