247 – O jornal francês Le Monde publicou nesta quarta-feira, 18, reportagem repercutindo a declaração do ex-diretor da Odebrecht Carlos Armando Paschoal, de que foi coagido pelo Ministério Público a criar o uma narrativa na ação penal contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do sítio de Atibaia.
“A declaração, divulgada na terça-feira, 16 de julho, teve o efeito de uma granada prestes a explodir. Mais uma visando os métodos de trabalho dos promotores e juízes da operação anticorrupção, seriamente comprometida pelas revelações do The Intercept Brasil“, diz o Le Monde.
Leia, abaixo, a matéria na íntegra, com tradução de Sylvie Giraud:
No Brasil, revelações sobre a Operação Lava Jato prejudicam ainda mais a imagem da justiça
Há um mês e meio que os métodos de trabalho, bem como as motivações dos procuradores e juízes da operação de combate à corrupção estão sendo questionados.
A frase foi lançada contra uma justiça brasileira à deriva, em margem de um depoimento com ares de requisitório. Em 3 de julho, Carlos Armando Paschoal, – ex-executivo do grupo de construção Odebrecht, empresa devastada pelo escândalo de corrupção descoberto pela operação judicial conhecida como “Lava Jato” – estava sendo interrogado pela Justiça de São Paulo, quando confessou que no passado teria sido “quase forçado” pelos promotores da Lava Jato a construir uma história no caso conhecido como o do “sítio de Atibaia”, uma casa de campo no Estado de São Paulo, que deu origem a uma segunda sentença contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, conhecido como Lula.
A declaração, divulgada na terça-feira, 16 de julho, teve o efeito de uma granada prestes a explodir. Mais uma visando os métodos de trabalho dos promotores e juízes da operação anticorrupção, seriamente comprometida pelas revelações do The Intercept Brasil.
Durante um mês e meio, o site cofundado pelo jornalista norte-americano Glenn Greenwald, vem escoando, em parceria com diferentes meios de comunicação brasileiros, trechos de mensagens e conversas cada dia mais embaraçosas entre os procuradores da Lava Jato e o ex-juiz Sergio Moro, que se tornou ministro da Justiça do governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro.
Destiladas no conta-gotas, as conversas revelam as ações de uma justiça que flerta com a ilegalidade e esquece-se da ética, orientada pelo objetivo de colocar atrás das grades aqueles que aos seus olhos são réus perigosos, e especialmente Lula, figura emblemática da esquerda brasileira.
Às mensagens revelando um claro prisma político, ao indicar que a operação pretendia ajudar a impedir o retorno do Partido dos Trabalhadores (PT, à esquerda) ao poder na eleição de 2018, vieram acrescentar-se, mais recentemente, revelações sobre a suposta ganância de Deltan Dallagnol, protagonista da operação. O promotor, conhecido por sua conferência de imprensa “PowerPoint” em fevereiro de 2017 de fevereiro, onde ele tinha nomeado Lula como o “comandante supremo” de uma gigantesca rede de corrupção, teria tentado negociar suas conferências fundando uma empresa na qual seu nome não apareceria.
Na quarta-feira, o jornal Folha de São Paulo informou que o jovem que sempre se apresentou como um ícone da ética e da moral, havia pedido para ele, sua esposa e seus filhos, entradas para o Beach Park, um parque aquático em Aquiraz, cidade do Nordeste, além de um cachê de 30.000 reais (aproximadamente € 7.100) para uma conferência sobre o combate à corrupção na Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) em julho de 2017. Foi aberta uma reclamação disciplinar contra o procurador.
“República Bananeira”
Na terça-feira, Sergio Moro, que liderou “Lava Jato”, tratou com desprezo essas últimas revelações, continuando a duvidar da veracidade das mensagens. “Esta campanha contra” Lava Jato e a favor da corrupção beira o ridículo (…). Se houver algo sério e genuíno, publiquem, por favor “, escreveu ele no Twitter.
O antigo xerife anticorrupção perdeu a sua aura de “salvador da pátria”, mas tem consciência de receber o apoio de uma parte da população, e, especialmente, do eleitorado mais radical de Jair Bolsonaro, que transformou o Presidente em um mito e Sergio Moro em seu apóstolo. “Bolsonaro é apoiado por 33% dos brasileiros, que são, como para Trump, seus defensores obstinados“. Para eles, toda a informação negativa é e será tratada como “fake new”, observa Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas, em São Paulo.
“É necessária uma investigação para descobrir se essas mensagens são autenticas. Mas, desde já, a imagem da justiça está seriamente prejudicada e o Brasil assume a aparência de uma república bananeira“, lamenta José Álvaro Moises, professor de ciência política da Universidade de São Paulo, referindo-se, não só às revelações relacionadas com a Lava Jato, mas à decisão de um juiz do Supremo Tribunal de suspender a investigação contra Flavio Bolsonaro, filho mais velho do presidente, e contra a intenção do Presidente de nomear, apesar das acusações de nepotismo, seu outro filho Eduardo como embaixador nos Estados Unidos.