Uma grande Lei social, a Lei Malaia, do católico Agamenon Magalhães, um dos expoentes da Doutrina social da Igreja

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“LEI MALAIA

Denominação dada ao Decreto-Lei nº 7.666, de 22 de junho de 1945, que dispunha sobre os atos contrários à ordem moral e econômica e resultou de iniciativa de Agamenon Magalhães, então ministro da Justiça. A denominação aludia pejorativamente aos traços fisionômicos daquela autoridade.

O decreto-lei, inspirado em alguns pontos na legislação norte-americana, arrolava uma série de atos considerados contrários aos interesses da economia nacional, como os entendimentos, ajustes ou acordos entre empresas comerciais, industriais e agrícolas; atos de compra e venda de acervo das mesmas empresas; atos de aquisição ou detenção a qualquer título de terras em proporção superior às necessidades de produção; paralisação total ou parcial de empresas comerciais, industriais e agrícolas, e incorporação, fusão, transformação, associação ou agrupamento de empresas comerciais, industriais ou agrícolas com a concentração das respectivas quotas em mãos de um mesmo grupo.

Tais atos seriam considerados nocivos ao interesse nacional se envolvessem indústrias bélicas, indústrias básicas, empresas editoras, jornalísticas, de rádio, de teledifusão ou de divulgação e de publicidade, se dele participassem empresas estrangeiras ou se eles resultassem da ação de empresas nacionais ou estrangeiras notoriamente vinculadas a coalizões, trusts ou cartéis ajustados no estrangeiro, nesse caso cabendo a desapropriação.

Caso praticado qualquer desses atos, seria notificada a empresa faltosa para, em prazo determinado, cessar a prática, e caso essa persistisse, seria declarada a intervenção, em caráter provisório, necessária às medidas de gestão para restabelecer a situação conforme os interesses da economia nacional.

O decreto-lei também proibia a fusão, incorporação, transformação ou agrupamento, sem prévia autorização, dos estabelecimentos bancários, de empresas cujo objeto social fosse a produção de gêneros alimentícios, de empresas de seguro e capitalização, de empresas de transportes, editoras, jornalísticas, indústrias bélicas, básicas, de tecidos e calçados, empresas de mineração, empresas de eletricidade ou concessionárias de serviços públicos.

Também não teriam validade, senão depois de aprovados e registrados, os atos, ajustes, acordos ou convenções em empresas industriais e comerciais que tivessem por fim equilibrar a produção com o consumo, regular o mercado, estabilizar os preços, padronizar ou racionalizar a produção, e estabelecer exclusividade na distribuição.

A fim de dar cumprimento ao disposto no decreto-lei, foi criada a Comissão Administrativa de Defesa Econômica (CADE) órgão autônomo com personalidade jurídica própria, diretamente subordinado ao presidente da República e presidido pelo ministro da Indústria e do Comércio, composto ainda pelo procurador-geral da República, e diretor-geral da CADE, representantes do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e do Ministério da Fazenda, representantes das classes produtoras e distribuidoras, e por um técnico em economia de comprovada idoneidade e competência.

A exposição de motivos que encaminhou o decreto-lei referia-se muito aos problemas decorrentes da economia de guerra, como os lucros extraordinários e o êxodo rural, os quais favoreceram o agrupamento de empresas em prejuízo da economia nacional, para concluir: “Esses fenômenos constituem conseqüências fatais do exercício abusivo do poder econômico contra as quais se tem sistematicamente insurgido a opinião pública leiga ou técnica, conforme se poderá verificar dos anais das conferências econômicas ultimamente realizadas e do pronunciamento unânime dos especialistas e técnicos do assunto.”

Publicado o decreto-lei, surgiu forte oposição às medidas propostas, tendo posteriormente o próprio Agamenon Magalhães resumido os argumentos contra o decreto-lei em duas ordens, uma de oportunidade política, pois na época já se abrira o problema da sucessão presidencial, e outra de natureza jurídica, pois a lei estabelecia a repressão administrativas aos trustes ou cartéis e era assim contra a tradição do judiciarismo americano.

Dois eminentes juristas, Raul Fernandes e Heráclito Sobral Pinto, em entrevistas pelos jornais, combateram fortemente o projeto. As classes produtoras encaminharam ofício ao presidente da República contra a execução do decreto-lei e João Daudt d’Oliveira, presidente da Confederação Nacional do Comércio e amigo do presidente, dirigiu-lhe carta também, levantando sérios argumentos contra a execução do decreto-lei.

De fato, o decreto-lei não seria posto em execução, e a CADE jamais se instalaria. Já em 9 de novembro o Decreto-Lei nº 8.162 o revogava. Mas o Decreto-Lei nº 7.666 representou importante papel histórico, por ter sido o primeiro diploma legal tratando da matéria no Brasil, e por ter constituído a base na qual se inspirou o deputado Agamenon Magalhães para apresentar em 1948, na Câmara dos Deputados, o projeto de lei que deu origem à Lei nº 4.137, conhecida como Lei de Remessa de Lucros.

Alberto Venâncio Filhocolaboração especial

FONTES: Boletim Min. Trab. (5/36); MAGALHÃES, A. Abusos; VENÂNCIO FILHO, A. Abuso; VENÂNCIO FILHO, A. Intervenção.