Julius Guttmann, um grande filósofo judeu, no livro “A filosofia do judaísmo” (São Paulo, Ed. Perspectiva, 2003, pp. 62-63), descreveu corretamente o ambiente filosófico popular estoico platônico, onde o cristianismo nasceu, tal como daí nasceu o “judaísmo rabínico”, o Talmud:
“Dessas teorias gregas, somente as formas mais populares em que elas estavam espalhadas entre as massas, por via oral ou escrita, parecem ter obtido eco no Talmud. Muita coisa na ética talmúdica lembra a sabedoria popular estóica. Uma e outra ensinam que tudo quanto o homem possui é empréstimo tomado de Deus, e portanto o homem não deveria queixar-se se Deus exige de volta aquilo que é Dele. Uma e outra consideram a alma uma hóspede [em viagem] deste mundo, louvam a virtude da moderação [medida certa] como a verdadeira riqueza, e aconselham o homem a viver cada dia como se este fosse o último. Algumas das máximas rabínicas que pedem ao homem que cumpra o seu dever sem pensar em recompensa apresentam forte semelhança formal com aforismas estóicos. (…). A influência estóica como tal é fora de dúvida. A comparação da alma a Deus deriva da metafísica estóica; a alma preenche e vitaliza o corpo como Deus preenche o mundo, e como Deus, ela não pode ser vista. O Talmud incorpora idéias de Platão assim como da Stoa, os quais, divorciadas de seu contexto sistemático, eram parte e parcela da cultura grega geral. (…). O Talmud utiliza tais idéias a fim de refutar os argumentos dos oponentes gentios e dos céticos judeus. A admonição “saiba o que responder a um epicurista” (para os rabis, o epicurista é o típico livre pensador)prova que o conhecimento de idéias estrangeiras foi promovido por considerações apologéticas”.