O Estado existe desde que existem sociedades humanas. Existe Estado nas pequenas aldeias de onde surgiram a vida social, há milênios, existindo economia mista, cooperativismo, Estado social e até democracia.
Na Idade Média existia, sim, o Estado, inclusive com este termo. Isto fica claro inclusive nas “Ordenações Manuelinas” (Lisboa, Ed. Fund. Calouste Gulbenkian, 1984, p. 33), no Livro I, Título II, “Do Chanceler Mor”.
O Chanceler era como um Primeiro Ministro (como um Vizir), tanto que, nos países parlamentaristas, o Ministro das Relações Exteriores ou o da Fazenda é chamado de Chanceler, sendo o Primeiro Ministro.
No título “Do Chanceler Mor” estão descritas as qualidades que deveria ter o Chanceler. Este deveria ter amor ao “Estado”, para que “possa e saiba servir seu ofício” (cargo público), “inteiramente”, “como a isso é obrigado”, “a bem de nossos vassalos e povo”, ou seja, para servir ao bem comum.
As “Ordenações Manuelinas” são de 1514, mas, na verdade, são como uma colcha de retalhos, formada da compilação de Leis, Alvarás, decisões de Cortes antigas e velhas ordenações bem mais antigas, seguindo, grosso modo, os modelos das “Decretais”, das “Leis” de Platão; do “Código Teodosiano”; das “Novelas” de Teodósio; dos Códigos gregoriano e hermogeniano; das “Pandectas” de Justiniano; e de outras codificações, como o “Breviário” (de 506 d.C., antes das Pandectas, redigido com base no “Código Teodosiano”) de Alarico, rei dos visigodos.
As “Ordenações” seguem o modelo também do “Fuero Juzgo”, da “Lei das Sete Partidas” e de outras do início da Idade Média.
Alarico (370-410 d.C.) foi um rei dos visigodos, que ocupou e saqueou Roma, em 409. O “Breviário” é de Alarico II (484-507 d.C), tendo sido editado em 506 d.C., com base nos códigos gregoriano e hermogeniano, tal como nos textos de grandes juristas romanos. Estas estruturas legais e estatais prepararam o Estado moderno e, em muitos pontos, continuam vigentes. Formam uma síntese entre ideias grego-romanas, fenícias, persas, romanas, católicas, bárbaras etc.
No “Prolegômeno” (introdução) de Dom Manuel (praticamente mantido no início das “Ordenações Filipinas”), Dom Manuel chama o Estado português de “República”.
Reconhece que “a justiça” é “necessária” “para a boa governança e conservação de toda República”.
Dom Manuel lembra que “a justiça consiste na igualdade”, “com justa balança dar o seu a cada um” (a cada um de acordo com suas necessidades).
O rei associa o regulamento das “Ordenações” ao “regimento e forais” existentes em “todas” as “cidades, vilas e lugares”, demonstrando que a estrutura das Ordenações e de outras codificações (por exemplo, os Regimentos Gerais elaborados pelos Governadores Gerais, no Brasil), surgiram como generalização dos velhos forais, no plano nacional, sendo as precursoras das Constituições nacionais.