Até Bakunin viu que o jusnaturalismo católico foi a corrente principal da democracia, na história

Bakunin constatou uma bela verdade: o jusnaturalismo (hebraico, socrático, platônico e aristotélico-estóico) foi a corrente teórica principal do movimento democrático, no processo histórico. Este jusnaturalismo foi chamado por Schumpeter de “teoria clássica” da democracia e tem, em seu núcleo, uma concepção positiva sobre a razão e liberdade, como fontes de regras racionais, consensuais, sociais para a proteção, conservação e promoção do bem comum.

Esta noção positiva da liberdade estava bem presente nos textos de Bakunin. Este grande anarquista adotou o anarquismo quando era jovem e cristão, deixando bons textos religiosos, os textos do jovem Bakunin. O livro de H. Arvon, “Bakounine. Absolu et Révolution” (Paris, Cerf, 1972), mostra que Bakunin tornou-se revolucionário por causa de Weitling e do cristianismo revolucionário da Liga dos Justos e também por influências de outras fontes cristãs, que também influenciavam a Liga dos Justos, em seu socialismo cristão pré-marxista.

Só mais tarde é que Bakunin se tornou ateu, mas era já era revolucionário antes e com bases cristãs. Mesmo afirmando que se tornara ateu, escreveu bons textos como, por exemplo: “socialismo sem liberdade é escravidão, é brutalidade”; e “a felicidade, o paraíso humano sobre a terra” é “ver e sentir minha liberdade confirmada, sancionada, estendida ao infinito pelo assentimento de todos os homens”.

O “ateísmo” de Bakunin e de Proudhon era fruto de erros destes autores, embora também contivesse a crítica de erros da parte humana da Igreja, das religiões positivas, das ligações de pessoas religiosas com os Estados burgueses ou absolutistas daqueles tempos. O velho Bakunin, como Proudhon, com certeza, estenderia suas mãos a João XXIII ou a Francisco I.

Bakunin, tal como alguns hereges antigos, rejeitava o Estado e as leis positivas em bloco, o que era um erro. Bakunin deveria, na linha jusnaturalista, ter rejeitado apenas as leis e as formas estatais iníquas, prejudiciais ao bem da sociedade, ao povo. No entanto, Bakunin também ensinava corretamente que a liberdade, para durar e ser efetiva, deveria estar regrada pelas “leis naturais”. Da mesma forma, Helvetius, no livro “O Espírito”, é jusnaturalista, defendendo leis boas, leis conforme ao bem comum, que é a essência do jusnaturalismo católico, tomista etc. O mesmo defenderam autores como Voltaire, Diderot, Rousseau e outros, todos rebentos da tradição católica, mesmo deturpando-a em várias pontos. 

Os textos de Bakunin sobre a “lei natural” e a liberdade mereceriam uma boa compilação, mostrando o prisma jusnaturalista de algumas boas idéias de Bakunin. Como demonstrei no meu livro sobre as origens religiosas do socialismo, Bakunin tornou-se socialista anarquista em sua juventude e, nesta época, o jovem Bakunin tinha fortíssimas idéias e sentimentos religiosos, hauridos do cristianismo primitivo, especialemente de Weitling, recebendo esta influência no período em que esteve na Suiça, quando era jovem.

Conclusão: o “jusnaturalismo” da Paidéia combinou-se com o jusnatualismo hebraico, formando o núcleo da parte humana do catolicismo.