A tradição democrata cristã popular, no Brasil, eclética, ecumênica, católica

Na linha democrática, Frei Francisco de Mont´Alverne (1784-1858), que marcou boa parte dos textos de formação dos sacerdotes no século XIX, ensinava que a “missão” do “cristianismo” é de “adoçar” e “minorar os males da espécie humana”. Este frei elogiava São Vicente de Paulo, o padre l´Epée, o abade Sicard e outros expoentes da caridade, do bem comum.

Frei Francisco participou do movimento da independência e da democratização do Brasil, tal como foi marcante na educação do clero na primeira metade do século XIX. Também influenciou grandes leigos católicos, como Gonçalves de Magalhães, que trouxe as idéias de Maine de Biran e de Cousin ao Brasil, numa boa linha ecumênica. O ecletismo de Cousin e outros era uma continuação do ecletismo católico tomista, que já existia no século XVIII, com o toque da tradição empirística franciscana, bem forte na cultura portuguesa.

O “ecletismo” foi chamado, por Louis Veuillot (um católico com vários erros), de “terceiro partido”. No fundo, foi a corrente hegemônica dos católicos no século XIX. Teve como expoentes homens como Ozanam, Lacordaire (adotando um tomismo aberto, combinado com idéias ecléticas), Montalembert, o grande Dupanloup e outros. Esta era a corrente da maior parte dos bispos franceses, especialmente dos Arcebispos de Paris (Sibour, Darboy e outros). Essa corrente também predominava na Editora dos Irmãos Garnier (que produziu uma parte significativa da bibliografia da época, no Brasil), o editor de Proudhon. Era uma corrente democrática e ecumênica, pluralista, aberta, eclética, aceitando a verdade de todas as fontes.

As análises de Sílvio Romero têm pontos corretos e erros. Acertam quando descrevem o primado da “filosofia espiritualista, católica e eclética” no movimento da Independência e da constitucionalização, no Brasil (de 1817 a 1868) e na América Latina. Erram, no entanto, ao não descrever a repulsa católica aos erros liberais capitalistas. Esta repulsa, no entanto, foi constatada pelos ideólogos liberais, que nunca se iludiram com a repulsa católica ao capitalismo. A igreja aceitou a democracia, como viu Sílvio Romero, mas não o capitalismo e a democracia liberal.

O movimento histórico do catolicismo buscou construir aos poucos uma democracia popular, social e participativa, popular e ligada ao povo. Este foi o esforço dos precursores da doutrina social católica, no século XIX. Autores como Alceu, Antônio Cândido, Barbosa Lima Sobrinho, o próprio Getúlio Vargas e Carpeaux são exemplos deste movimento histórico católico, para construir uma verdadeira democracia popular.