Benedetto Croce, Alceu e o socialismo democrático – democracia popular com economia mista e Estado social

Benedetto Croce (1866-1952) foi um autor muito estimado por Alceu Amoroso Lima. Teve o mérito de lutar contra o fascismo e desenvolver uma síntese entre hegelianismo e democracia. Alceu foi, no início, influenciado por boas fontes como Sílvio Romero, Benedetto Croce, Graça Aranha (panteísta) e Henri Bergson.

O livro de Walquíria Domingues Leão Rêgo, “Em busca do socialismo democrático” (São Paulo, Ed. Unicamp, 2001), destaca corretamente o papel de Croce na elaboração das bases teóricas de um socialismo democrático, num papel semelhante ao do de Bobbio, hoje.

O socialismo democrático, como foi destacado por Pio XI, na “Quadragesimo anno”, retomou várias idéias da doutrina social da Igreja e também do socialismo utópico cristão, pré-marxista (Luís Blanc, Leroux, Victor Hugo e outros socialistas cristãos). As teses do socialismo democrático (como pode ser visto no livro de Harold Laski, “Socialismo y libertad”, Buenos Aires, Ed. Dedalo, 1961), de uma democracia social e popular, coincidem, em vários pontos, com o catolicismo social.Pensem em Keteller e Pesch, por exemplo. Ou Ozanam. 

Croce viu corretamente que a “concepção católica” sobre o Estado considera que a pessoa, o cidadão, o povo, deve ser a origem, o exercício e a finalidade do Estado. O Estado, para ser legítimo, deve ser apenas um meio, uma ferramenta, um instrumento, um agente a serviço da sociedade, do bem comum (tanto o bem da sociedade, como da família e de cada pessoa).

No livro de Croce, “Aspectos morais da vida política” (Rio de Janeiro, Ed. Athena, 1935, p. 80), este grande crítico italiano, que valorizava a razão e as emoções na estética, elogiou uma encíclica de Pio XI, de dezembro de 1926, contra a “Action Française”, escrevendo:

“… que se pense, sim, na recente encíclica papal (dezembro de 1926) de protesto contra a “concepção que faz do Estado o fim, e do cidadão, do homem, o meio, tudo monopolizando e absorvendo aquele”: concepção (acrescenta-se) que “não pode ser a concepção católica”. O papa, quaisquer que sejam naquela encíclica as suas referências e os escopos que praticamente quer alcançar, tem razão no enunciado teórico, que é incontrastável, porque aquilo que por ele, no símbolo da Igreja, é reivindicado contra o Estado é, nem mais nem menos, a consciência moral. E cabe à Igreja católica o mérito de, da maneira como pôde e soube, ter oposto esta exigência ao cru e unilateral maquiavelismo”.

O “cru e unilaterial maquiavelismo” era a doutrina de Mussolini (e, em parte, de Maurras, nesta época e, por isso, estas idéias de Maurras foram devidamente condenadas). Pio XI condenou o fascismo na “Non Abbiamo bisogno”, em 1931, designando este erro como “estatolatria”. Sérgio Panunzio foi um dos principais teóricos do fascismo. Seu livro, “Teoria generale dello Stato Fascista” (Padova, Ed. Cedam, 1937), na p. 49, confessa: “O Estado fascista é, em verdade, um Estado tipicamente e plenamente totalitário”, “é um Estado Estatocrático” (tradução de minha autoria). Há a mesma doutrina nos textos de Alfredo Rocco, Gentili, Costamagna, Giurco (cf. “O partido único”) e outros.

Os fascistas resumiam sua concepção estatal na frase de Mussolini: “tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado” (p. 54). Panunzio resume assim: “A estatocracia” é a “fórmula ideal do Estado fascista”. Neste livro, Panunzio expõe a concepção fascista de partido único e de Estado-partido, como uma concepção da “ditadura” fascista.

As idéias de concentração do poder no Estado (com a crítica à divisão do poder em três poderes, elogiada por Leão XIII) e de obediência cegas às leis estatais são os erros fascistas sobre a obediência cega às normas estatais. São os mesmos erros do normativismo estatal kelseniano, de Hans Kelsen (o autor predileto dos juristas da ditadura militar e dos capitalistas).