Direito Penal deve abolir gradualmente as prisões

A concepção do direito criminal como um meio de defesa da sociedade e de melhoria (regeneração) do criminoso é profundamente cristã, como mostrou Francesco Carnelutti, Francesco Carrara (1805-1888, professor em Pisa, senador e jurista) e outros grandes juristas da Escola clássica cristã. Esta idéia está clara nos textos bíblicos (nas leis penais hebraicas) e nos textos dos Santos Padres. Santo Agostinho ensinava que as leis penais, as penas, devem ser meios de melhoramento moral dos criminosos, ou seja, no fundo, devem ser penas abertas, formas de restrição da liberdade, sem presídios. Formas de reabilitação, regeneração, pois o Estado inteiro deve ser uma forma de proteção das pessoas.

Todas as normas estatais (positivas) devem ser racionais e bondosas, até mesmo as normas penais e de execução das penas. Como explicou Hegel, o Estado deve ser “o racional em si e por si”, algo racional, pautado pelo bem comum. Os presídios devem ser transformados, inicialmente, em locais de regeneração da dignidade humana (pelo estudo, pelo trabalho livre e remunerado etc), e não de sofrimento e degradação. Na mesma linha, há o folheto de Kropotkin, “Os cárceres e sua influência moral sobre os presos” (Barcelona, Ed. Tusquets, 1977), que adota uma ética, no fundo, cristã, como os demais textos éticos de Kropotkin, baseados na ajuda mútua. Depois, o correto é abolir a prisão, com formas de restrição parcial da liberdade, sem enjaulamento. 

Conclusão: a concepção de “penas medicinais” está nos textos canônicos da Idade Média, tal como nas regras das ordens e nos textos de Agostinho. Movido por estas idéias, o papa Clemente XI criou, em Roma, em 1703, estabelecimentos de reeducação para os delinquentes. Os quakers, na Pensivânia, apenas dão continuidade a esta boa tradição. Há a mesma tendência nos expoentes cristãos e humanistas como Beccaria, John Howard, Elizabeth Fry, Marat, Pedro Dorado, Concepción Arenal (autora de “El visitador Del preso”), ampliados nos textos de juristas como Luis Jimenez de Asúa (1889-1970), Ancel, Gramática, Prins, Alessandro Baratta e grandes penalistas. No Brasil, sempre é bom lembrar as figuras de Cândido Mendes e Roberto Lyra, sendo Lyra um grande socialista, católico e nacionalista. As prisões devem ser abolidas mesmo, substituídas por outras formas de intervenção estatal, que assegurem a ressocialização dos criminosos.