José Joaquim Gomes Canotilho, no livro “Direito Constitucional e Teoria da Constituição” (7ª. edição, Coimbra, Livraria Almedina, 2003, pp. 713-714), fez um excelente resumo sobre a concepção jurídica e política do melhor da Paidéia, mostrando que esta concepção jusnaturalista foi acolhida pela Igreja, inclusive na Idade Média e esta concepção só foi atacada por Hobbes. Vejamos o texto de Canotilho:
“Desde o tempo pré-socrático ou Aristóteles, passando por Sócrates, os estóicos e Platão, que o conceito de lei é praticamente inseparável da sua dimensão material: leis verdadeiras são as leis boas e justas dadas no sentido do bem comum. A lei só pode ser determinada em relação ao justo (igual), dirá Aristóteles na “Ética a Nicómaco”, a “soberania da lei equivale à soberania de Deus e da razão”, “é a inteligência sem paixões”, escreverá ainda o mesmo autor em “A Política”.
A lei é a “suprema ratio, ínsita na natureza”, opinará Cícero.
A “lei é uma ordenação racional, dirigida no sentido do bem comum e tornada pública por aquele que está encarregado de zelar pela comunidade”, escreverá Santo Tomás.
Retenhamos, pois, as duas características da lei, mais ou menos explicitamente acentuadas pela filosofia antiga e intermédia: a dimensão material, na medida em que lei era expressão do justo e do racional: dimensão de universalidade, porque a lei se dirigia ao bem comum da comunidade. “A lei ao dispor só de uma maneira geral, não pode prever todos os casos acidentais” (Aristóteles, “Política”, III, X).
A natureza geral da lei ressaltava também da forma clara como a jurisprudência romana distinguia entre as leis (“leges”) e os privilegia: através das primeiras, o povo estabelecia uma determinação geral; os segundos eram determinações individuais a favor ou contra particulares. (…)
Com Hobbes, surge o conceito voluntarista e positivo de lei: “a lei propriamente dita, é a palavra daquele que, por direito, tem comando sobre os demais”. Deste modo, a lei é vontade e ordem e vale como comando e não como expressão do justo e racional. Daí a fórmula: “autorictas, non veritas facit legem”.
O ponto central do melhor da teoria política da Paidéia é, assim, a concepção de “lei” da Paidéia e da Bíblia: a lei positiva (tal como o poder constituído) justa, legítima, natural, é a que expressa “o justo e racional”, as exigências (regras) do bem pessoal, familiar e social. Como destacou Platão, no livro “Leis”, a lei deve ser uma regra “racional” (“dianomén”, cf. n. 714 a) e também deve ser uma “opinião comum” (“dogma koinón”, cf. n. 644 d). A concepção democrática popular exige economia mista, Estado social, estatais, planejamento público participativo etc.