A consciência do povo é o conhecimento e o poder de conhecer do povo

Um dos mais antigos dicionários da língua portuguesa, o “Diccionario da Lingua Portugueza” (Lisboa, Typographia Lacérdina, 1813, p. 555), de Antônio de Moraes Silva (com base no dicionário mais antigos do padre Raphael Bluteau), ilustra bem a dupla acepção de palavras chaves e essenciais da vida política, da terminologia política, como “razão”, “consciência”, “sabedoria” etc.

Por exemplo, no verbete “razão”, há os seguintes conceitos: “a potência intellectual em quanto discorre e raciocina”, no sentido subjetivo. Já, no sentido objetivo, como efeito da “potência” de racionar, Moraes explica que “razão” significa também: “o discurso, o ato discursivo”, “a ordem ou lei”, “o argumento”, “a causa”, “o discurso fundado, no que o entendimento alcança, pelos meios naturais, e sem revelação”, pelo “uso da razão”, “o conhecimento do bem ou mal moral”, “as palavras, com que exprimimos os raciocínios ou conceitos”. A expressão “ato discursivo” significa o mesmo que diálogo.

Há a mesma dupla acepção no termo “saber”: “conhecer” e “sciencia”, “doutrina”, “ter as partes do sábio”. No verbete sobre “inteligência” (p. 170) há a mesma distincão: “faculdade de entender” (como causa) e “conhecimento, juízo” (sentido objetivo, como efeito). O verbete “conhecimento” (p. 446) significa “o ato de conhecer” (no sentido subjetivo, de causa) e a “idéia, notícia, erudição” e “informação” (no sentido objetivo, de efeito).

CONCLUSÃO: a “sabedoria” do povo, no sentido subjetivo, é a faculdade criadora (de conhecimento” do povo, especialmente de regras racionais e sociais exigidas pelo bem comum. Esta faculdade é a base (matriz, fonte imediata) da soberania da sociedade. Neste sentido, Paulo VI, num discurso sobre o tomismo, em 21.04.1974, elogiou o ecumenismo e a capacidade de aprender de Santo Tomás (o principal Doutor da Igreja, exemplo de pensador), pois este, “com as suas preferências aristotélicas, ou seja, realistas”, “sem nada menosprezar da verdade contida em todos outros sistemas filosóficos” apontou um “caminho” “para a investigação humana, a saída para um possível progresso contínuo”.