A Doutrina da Igreja quer um amplo Estado Distributista, que erradique a miséria e a opulência privada (a concentração privada de bens em poucas mãos)

A Igreja defende um extenso Estado social e econômico, que distribua os bens, distributista, para realizar a destinação universal dos bens.

O Episcopado de Portugal, em 1974, numa carta pastoral, escreveu: “nem todos os socialismos que hoje correm pelo mundo estão dominados por ideologias inaceitáveis para um cristão”. É necessário um “esforço de discernimento” (n. 50), para, conforme disse Paulo VI, “estabelecer o grau de compromisso possível esta causa, salvaguardados os valores, principalmente da liberdade, da responsabilidade e da abertura ao espiritual, que garante o desabrochar integral do homem”.

Na Espanha, os católicos mais preparados militam no PSOE, que realizou uma boa abertura à Igreja, tal como no Podemos. O mesmo ocorre na França, no Partido Socialista.

Na Itália, os católicos militam no Partido Democrático, Margarita, fusão do melhor do Partido Democrático Cristão com o melhor do PSI e do melhor do PCI. Na Inglaterra, os católicos militam no Partido Trabalhista, socialista.

Nos países escandinavos, militam nos Partidos socialistas. Idem na Austrália, no Partido Trabalhista. Idem no Canadá, nos partidos mais a esquerda. Em Portugal, militam no Partido Socialista, na aliança da Geringonça. Nos EUA, na esquerda do Partido Democrático, entre os socialistas democráticos.

No Brasil, há dezenas de Bispos e Arcebispos que escreveram livros ou artigos favoráveis a formas de socialismo com democracia e distributismo e centenas de escritores católicos que defenderam o mesmo, como Alceu, Domingos Velasco, Plínio de Arruda Sampaio, Francisco Whitaker, Frei Betto e outros.

No discurso de posse na ABL, Evaristo de Moraes Filho escreveu:

“Da Ilusão americana, quase todos só se lembram da sua denúncia do imperialismo americano, pois este é um livro do qual muito se fala, mas que poucos o leram realmente. Dando seguimento à coerência do que seria esta Cadeira n. 40, escreve: ”O ódio não cria cousa alguma. Só o amor é criador.” Estamos a ouvir Alceu Amoroso Lima! E em outro passo, mais diretamente: ”Sem dúvida, a questão operária é de todos os países e o problema da riqueza e da pobreza é tão antigo co­mo o mundo. Todas as soluções desse problema são soluções muito relativas e sempre provisórias.” … “Na vida moderna o capital cresce por si mesmo, cada vez mais se avoluma, e é fora de dúvida que a fatalidade faz com que os ricos fiquem cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres” …

A Igreja, com Eduardo Prado, o melhor amigo de Eça de Queiroz, detestava e detesta o militarismo, e o imperialismo, os latifúndios, o grande capital privado etc. Eduardo Prado foi o primeiro grande autor brasileiro a atacar o militarismo, o imperialismo dos EUA, os latifúndios e elogiava o socialismo cristão, pré marxista, que antecedeu a Marx, dando a Marx suas melhores ideias.

Como viu Evaristo de Morais, a Igreja, pela voz de Eduardo Prado, “patrocina o socialismo cristão, e não o faz somente por palavras”,… “procurando estender a mão aos operários, que afinal são a força, são o número, são a justiça e serão o poder amanhã.”

Este ideal é a continuação da linha de Mably, Morelly, o bispo Gregório, Cobbett, Sismondi, O’Connell, Lamennais, Buchez, Ketteler e também dos padres da Inconfidência Mineira, da Revolução de 1817, da Independência, de Frei Caneca (1779-1825) e outros, tal como do padre Feijó.

Também é a mesma boa linha presente nos textos do padre José Antônio Pereira Ibiapina (1806-1883), nos pobres de Canudos, no grande padre Júlio Maria, dos grandes leigos da Igreja (nos séculos XIX e XX), nos melhores textos do padre Cícero Romão Batista e da maior parte do Episcopado brasileiro e mundial.

O ideal concreto de uma democracia popular, social e participativa está no núcleo dos melhores textos do movimento da “teologia política”. Basta ver os textos de Moltmann (“Teologia da esperança”, 1964), Johann Baptist Metz (autor de “A teologia do mundo”, 1968), Dorothee Solle (autora de “Paciência revolucionária” e “Amar e trabalhar”), Karl Rahner, Hans Kung e outros autores.

A corrente da “teologia política”, ao sublinhar as bases éticas da religião e do Estado, adota, no final das contas, a tese jusnaturalista, que considera o povo como o legislador natural, como administrador natural dos bens, destinatário natural dos bens, tendo o povo como senhor natural de si mesmo, dos bens e gestor da natureza, tal como co-criador, continuador pela eternidade da Criação.