O padre Ferdinando Galiani, outro precursor católico de Marx e do marxismo, autor de parte das ideias de Marx

O padre Ferdinando Galiani, napolitano, também atacou duramente os erros capitalistas dos fisiocratas (no livro “Diálogos sobre o comércio de grãos”, 1770) e foi muito citado por Marx, inclusive no livro “Contribuição à crítica da economia política”.

Voltaire também elogiou o livro de Galiani, escrevendo “L’homme aux quarante écus” (“O homem com quarenta escudos”), uma sátira aos fisiocratas onde um banqueiro rico (sem terras, mas com muito dinheiro) ri de um agricultor pobre, com apenas 40 escudos, que paga impostos, estando o banqueiro isento.

Os fisiocratas defendiam um sistema tributário com um imposto único sobre a renda da terra, de acordo com os interesses dos capitalistas e ainda combatiam todas as formas de intervenção estatal na economia.

Marx citou também o grande católico Antônio Genovesi (1712-1769), um teólogo italiano inimigo dos erros dos fisiocratas. São algumas das fontes cristãs das idéias de Marx, que facilitam o diálogo.

Marx transcreveu, pelo menos, oito textos de Galiani, no Livro I, de “O capital”.

Marx aprendeu muito com os textos do padre Galiani, citados nos “Grundrisse”. Por exemplo, Marx citou o livro “Da Moeda”, do padre Galiani, escrevendo:

…este autor expressa já um conceito acertado do valor: “a fadiga (…) é a única que dá valor às coisas”. Distingue também qualitativamente o trabalho, não somente distinguindo entre diferentes ramos da produção, senão também entre trabalho mais ou menos intenso etc. (…) Se supera assim a diferença qualitativa e o produto de um tipo mais elevado [de trabalho] se reduz de fato a uma quantidade de trabalho simples. (…) Os metais…são usados como moedas porque valem…., não valem porque são usados como moedas” [Il metalliusansi per moneta perché vagliono…, non vagliono perché usansi per moneta]. 

É a velocidade do giro do dinheiro, não a quantidade dos metais, o que faz que o dinheiro seja muito ou pouco [É la velocità del giro del denaro, non la quantità, che fa apparir molto o poco il denaro]. (…)

Uma formosa frase de Galiani:

Esse infinito que (as coisas) não alcançam em sua progressão, o alcançam na circulação (no giro)”.

Falando do valor de uso, diz Galiani, de forma muito bela [correta]:

O preço das coisas é uma relação [ragione, proporção]…o preço é a proporção entre as mesmas e nossas necessidades, e não tem ainda medida fixa. Talvez a medida será encontrada ainda. Eu, por mim, creio que é [a medida] o homem mesmo. (…) De fato, (o homem) é a única e verdadeira riqueza”[ è l’única e vera richezza]. “A riqueza é uma relação entre duas pessoas” [La richezza e una ragione tra due persone”].

De Galiani, Marx aprendeu várias coisas importantíssimas, que em manuais estalinistas aparecem como criações isoladas de Marx (no fundo, toda criação são novas sínteses).

O estudo das fontes de Marx é importantíssimo, pois revela as fontes cristãs de seu pensamento, facilitando, assim, o diálogo entre católicos e marxistas, e a ação conjunta contra o capitalismo.

As frases do padre Galiani – o homem é a “única e verdadeira riqueza” e “a riqueza é uma relação” – mostram que as riquezas (o capital e o latifúndio) são relações sociais de opressão dos trabalhadores.

O ponto mais importante foi Galiani ter escrito que não há medida fixa para os preços das coisas e que a medida é o próprio homem (ou seja, as necessidades das pessoas, os bens que necessitam para uma vida digna).

Galiani retirou esta idéia de Aristóteles e dos textos da Bíblia e dos Santos Padres.

Significa que os bens devem atender às necessidades das pessoas e, por isso, estão sujeitos à soberania (estima comum) da sociedade. Os preços (os valores das coisas), tal como todos os bens e o controle sobre os mesmos, devem ser fixados pela estima comum (como ensinou São Tomás de Aquino), pela sociedade organizada, por formas consensuais, estatais, planejamento público participativo, socialismo participativo.

Estima comum significa soberania da sociedade, consenso popular (que é também a base real da fé cristã e da democracia), ou seja, acordos (planos consensuais) entre as pessoas, visando atender às necessidades de todos e, assim, a destinação universal dos bens. Significam planos, formas de planejamento participativo, com o primado do bem comum e do trabalho.

Estas idéias contêm, implicitamente, as bases teóricas de um modo de produção com base em unidades de produção geridas pelos trabalhadores com formas de planejamento participativo, tendo como finalidade o bem comum (obter condições de vida dignas para todos, como dizia explicitamente João XXIII).