Mesmo Marx distinguia entre a pequena propriedade pessoal fundada no próprio trabalho e a propriedade iníqua, fundada na exploração do trabalho alheio

Karl Marx distinguia entre propriedade pessoal e propriedade capitalista.

Assim, Marx, no livro I, de “O capital” (Rio, Ed. Civilização Brasileira, 2002, pp. 874-891), escreveu bons textos sobre a propriedade pessoal do trabalhador sobre suas condições de trabalho:

Tendência histórica da acumulação capitalista

A que se reduz, em última análise, a acumulação primitiva, a origem histórica do capital? Quando não é transformação direta de escravos e servos em assalariados, mera mudança de forma, significa apenas a expropriação dos produtores direitos, isto é, a dissolução da propriedade privada baseada no trabalho pessoal, próprio.

A propriedade privada, antítese da propriedade coletiva, social, só existe quando o instrumental e as outras condições externas do trabalho pertencem a particulares. Assume caráter diferente conforme esses particulares, sejam trabalhadores ou não. Os matizes inumeráveis que a propriedade privada oferece à primeira vista refletem apenas os estados intermediários que existem entre esses dois extremos, a propriedade privada de trabalhadores e a de não-trabalhadores.

A propriedade privada do trabalhador sobre os meios de produção serve de base à pequena indústria, e esta é uma condição necessária para desenvolver-se a produção social e a livre individualidade do trabalhador.

Sem dúvida, encontramos essa pequena indústria nos sistemas de escravatura, servidão e em outras relações de dependência. Mas ela só floresce, só desenvolve todas as suas energias, só conquista a adequada forma clássica quando o trabalhador é o proprietário livre das condições de trabalho (meios e objeto de trabalho) com as quais opera, a saber, o camponês é dono da terra que cultiva, e o artesão, dos instrumentos que maneja com perícia. (…)

A expropriação do produtor direto é levada a cabo com o vandalismo mais implacável, sob o impulso das paixões mais infames, mais vis e mais mesquinhamente odiosas.

A propriedade privada, obtida com o esforço pessoal baseada, por assim dizer, na identificação do trabalhador individual isolado e independente com suas condições de trabalho, é suplantada pela propriedade capitalista, fundamentada na exploração do trabalho alheio, livre apenas formalmente. (…)

O modo capitalista de apropriar-se dos bens, decorrente do modo capitalista de produção, ou seja, a propriedade privada capitalista, é a primeira negação da propriedade privada individual, baseada no trabalho próprio.

Mas a produção capitalista gera sua própria negação, com a fatalidade de um processo natural. É a negação da negação. Esta segunda negação não restabelece a propriedade privada, mas a propriedade individual, tendo por fundamento a conquista da era capitalista: a cooperação e a posse comum do solo e dos meios de produção gerados pelo próprio trabalho. (…)

Por princípio, a economia política confunde duas espécie muito diferentes de propriedade: a que se baseia sobre o trabalho do próprio produtor e a sua antítese direta, a que se fundamenta na exploração do trabalho alheio. Esquece que esta só cresce sobre o túmulo daquela. (pp. 881-882) (…)

Mas não estamos tratando aqui de examinar a situação das colônias. Interessa-nos apenas o segredo que a economia política do Velho Mundo descobriu no Novo e proclamou bem alto: o modo capitalista de produção e de acumulação e, portanto, a propriedade privada capitalista exigem, como condição existencial, o aniquilamento da propriedade privada baseada no trabalho próprio, isto é, a expropriação do trabalhador.” (p. 891).

O texto transcrito é claro.

Marx distinguia, corretamente, entre a “propriedade privada individual, baseada no trabalho próprio” (que seria restabelecida, “restabelece”) e a “propriedade privada capitalista”, que seria abolida, junto com o latifúndio.

No fundo, a Doutrina social da Igreja quer a difusão da pequena propriedade fundada sobre o trabalho pessoal, a difusão de bens, um vasto Estado social, estatais, cooperativas etc. Distributismo radical, com erradicação da miséria e das grandes propriedades privadas, especialmente a propriedade capitalista, principalmente erradicar os bancos privados.