Christopher Hill: houve ampla influência bíblica na origem do movimento democrático e socialista

Christopher Hill demonstrou a influência bíblica no movimento democrático inglês, reconhecendo o papel progressista da religião hebraica e cristã na eclosão da democracia moderna. 

John Edward Christopher Hill (1912-2003) foi um dos maiores historiadores marxistas da Inglaterra.

Hill demonstrou, além de qualquer dúvida razoável, em várias obras, a influência da Bíblia e da religião na gestação e na estrutura da democracia na Inglaterra. Em seu livro “A Bíblia inglesa e as revoluções do século XVIII” (Rio de Janeiro, Ed. Civilização Brasileira, 2003, p. 600), Hill ensinou que:

“Homens e mulheres usaram o idioma bíblico e as histórias bíblicas para a discussão de questões religiosas, políticas, morais e sociais, que deveriam ser difíceis de abordar diretamente. O conceito de povo eleito ajudou a expressar a emergência do nacionalismo inglês, tanto quanto ofereceu a Gerrard Winstaley e aos diggers certa confiança de que suas colônias comunistas estavam realizando a verdade da profecia bíblica; em última análise, isto ajudou a estabelecer a dissensão como a última representação da sociedade inglesa. A ideia de que Deus estaria abandonando os ingleses eleitos fez com que alguns emigrassem para a América, outros lutassem por uma sociedade mais devota na própria pátria e por uma sociedade mais consciente de suas obrigações internacionais”.

Se desejamos compreender a mentalidade que prevaleceu na Inglaterra do século XVIII, o melhor que podemos fazer é seguir a recomendação de Jack Fisher e começarmos pela Bíblia. A Bíblia em língua inglesa ajudou homens e mulheres a pensarem sobre sua sociedade, a criticarem suas instituições, a questionarem alguns de seus valores. Ela gozou de uma autoridade a qual nenhum outro livro jamais teria aspirado: os reis e seus oponentes apelaram para a Bíblia durante os grandes conflitos das décadas revolucionárias. Pelo menos um dos comentaristas registrou que o jesuíta Robert Parsons, o regicida John e o republicano whig Algernon Sidney, todos citaram os mesmos textos bíblicos para sustentar objetivos políticos bem diferentes.

“Os missionários da China possuíam as grandes alegorias bíblicas de Bunyan traduzidas, e quando os rebeldes de Taiping, em meados do século XIX, reuniram milhões de camponeses em uma revolta sem precedentes antes de 1948, que quase derrubou o imperador, a Bíblia e The Pilgrim´s Progress eram os livros favoritos de seus líderes. (…)

“Thomas James, William Crashawe, Perkins, Preston e Chillingworth, assim como alguns um pouco menos iluminados como Greenhill e Burroughs, o grande Milton e Owen, os radicais Walwyn, Winstanley, Writer e Fischer. Eles leram o seu presente na Bíblia, assim como Hobbes o leu no estado da natureza”.

“Eles encontraram na Bíblia um guia de ação, fazendo um grande esforço para compreender a relevância das historias bárbaras presentes em Juízes, Reis e Crônicas, e tentando aplicá-las a sua própria sociedade, mais sofisticada. A verdadeira aquisição destes vastos volumes exegéticos pode parecer inadequados ao esforço empregado, todavia, o efeito que estas obras geraram, dando autoridade a seus sermões e livros, não deve ser subestimado”.

“Para, em última instância, verificarmos a Inglaterra tornou-se uma democracia, devemos muito a discussões iniciadas por aqueles estudiosos”.

Hill escreveu obras como “Os eleitos de Deus” e “Origens intelectuais da Revolução Inglesa” que abonam o núcleo da tese deste meu blog.

Os livros de Edward Palmer Thompson também reconhecem as origens cristãs e teístas do movimento democrático anti-capitalista.

A autobiografia de Eric Hobsbawn termina elogiando o PCI, como o melhor exemplo, inclusive no bom relacionamento com os militantes cristãos.

A linha de István Mészáros, ligada a Lukács, é outra abonação, pois possui muitos pontos comuns com a doutrina da Igreja, pela valorização da consciência.

Conclusão: os livros de Hill, que deveriam ser lidos nas CEBs, abonam a tese fundamental deste blog sobre as raízes religiosas da democracia social e participativa, tal como sua relação intrínseca com o socialismo democrático, com a liberdade e o bem comum.