As partes boas dos textos de Foucault são ideias cristãs, hebraicas e do melhor da Paideia ampla

A concepção positiva de poder, do Estado, de Foucault, coincide em vários pontos com a concepção cristã do poder

Foucault criticou corretamente o poder iníquo, “disciplinador”, “exterior”, destruidor até mesmo do corpo humano. Criticou as prisões, o poder militar, os quartéis, o abuso da força pelo Estado, a desgraça do sistema carcerário, o mal dos manicômios, dos internatos etc. 

Foucault denunciou o “poder-repressão”, punitivo, sancionador. Neste ponto, seus textos críticos, tal como os de David Cooper (em “Gramática da vida”), têm respaldo na doutrina da Igreja.

Os textos bíblicos e dos escritores católicos também mostram que o poder pode ser diabólico, como era o poder do Faraó, de Herodes, Nero e outros tiranos. Como explicava Diderot, se todo poder fosse bom, seria bom o poder amplo do Anticristo. Ou seja, há o poder bom, e há o poder diabólico, perverso, reificador. 

Foucault, em suas obras (especialmente “A vontade de saber”) e entrevistas, também mostrou o lado positivo do poder. Nas palavras da prof. Thamy Pogrebinschi, resumindo idéias de Foucault: o poder (como a potência ou poder, o Estado, em Spinoza) pode ser libertador, “autopoiético”, no sentido de “autogoverno” (de liberdade, autogestão, autodeterminação etc).

Foucault também ensinou que o poder é “produção”, “potência”, quando o poder se funde ao saber, numa forma de “poder-saber” (inspiração em Platão, Aristóteles e nos estoicos).

Pondo os textos de Foucault em termos tomistas, o poder deve ser regido pelo Diálogo, o consenso, a ética, a sabedoria do povo, o saber, o conhecimento, a filosofia, por nossos melhores sentimentos e instintos. Não se trata, a meu ver, de um “novo conceito” de poder, da autoria de Foucald, e sim de uma reprise da tese platônica e hebraica do poder-sabedoria, bem exposta no livro “Sabedoria”.

O poder (o Estado) deve ser difundido, controlado e regrado pelo bem comum, pela sabedoria comum, do povo.

No livro “Microfísica do poder” (Rio de Janeiro, Ed. Graal, 1979), Foucault demonstra que o poder existe fora do Estado, até mesmo nas moléculas das estruturas sociais, familiares e econômicas. Assim, mesmo as relações de produção devem ser controladas pelos trabalhadores, para não haver opressão. 

Conclusão: os melhores textos de Foucault coincidem com a tese do cristianismo: o poder concentrado e monopolizado é espúrio, principalmente o poder voltado apenas para o bem do titular do poder, sendo este o conceito de “tirano”, um nome odiado no cristianismo, como ressaltavam Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino.

O poder deve ser difundido, como todos os demais bens. A regra correta da ética é simples: democratização radical do poder, dos bens, do prazer, da alegria, da felicidade. 

Esta regra vale para as famílias (devem ser regidas por conselhos de famílias), as unidades de vizinhanças (bairros, cidades, regiões, nações etc) e também as unidades econômicas, que devem ser regidas pelos trabalhadores.

Os trabalhadores devem controlar os bens de produção nas unidades onde trabalham e devem participar do poder do Estado, através de formas de planejamento participativo.