Doutrina da Igreja exige Estado social, anticapitalista, anti latifundiário, anti monopólios privados, anti grandes fortunas

As teorias da translação (a mais antiga e tradicional), da designação (ligada a Taparelli e a alguns historicistas) e as teorias mistas coincidem nas teses mais importantes:

1º) a fonte imediata das leis positivas é a “lei natural”, ou seja, a consciência da sociedade, do povo, das pessoas comuns, das ideias práticas do povo (e o mesmo vale para as boas emoções do povo);

2º) há a relatividade das formas positivas de Estado e de governo, o ponto essencial é que estas formas atendam ao bem comum;

3º) Deus não destinou o poder e os bens a nenhuma pessoa ou família concreta, deixando este ponto às formas jurídicas e políticas positivas, à liberdade humana, do povo, para que os bens atendam às necessidades e à plenitude da vida de todas as pessoas;

4º) todos devem participar dos bens e do poder, o Estado deve ser um Estado servo do povo, sob o controle do povo organizado; e

5º) o poder e a gestão dos bens deve ser racional, de acordo com os ditames da razão, presente em todos. No fundo, somos e devemos ser gestores, administradores, ecônomos, controladores do Universo, do fluxo das coisas, co-criadores, co-renovadores do universo. 

Em outros capítulos deste blog, em outras postagens, há mais dados sobre as teorias da translação e da designação.

Vejamos, neste capítulo, a teoria mista de Leclercq e principalmente de Desqueyrati, que ilustram claramente os pontos comuns a estas doutrinas.

Desqueyrati, no livro “Doctrina política de la Iglesia” (Bilbao, Ed. Desclée de Brouwer, 1966, T. I, pgs. 125/141), ensina que o poder político vem de Deus, mas não por uma intervenção extraordinária da Providência, e sim por meios naturais, pela lei natural, pela razão, consenso e natureza, pelas ideias do povo. A “autoridade” é uma posição (posto, cargo) com funções, deveres. Nenhuma pessoa tem direitos especiais ao poder.

Os cargos de autoridade (frações de poder) são funções (serviços), como ressaltou São Paulo, na “Carta aos romanos” (13,4), que chama até “o príncipe” (o que detém o principado, o cargo mais elevado) de “ministro”, servo, funcionário do povo.

Assim, o poder público (as formas concretas, tal como seus depositários, os agentes públicos) justifica-se (legitima-se) na medida em que o poder é exercido de acordo com a finalidade intrínseca do poder, na medida em que defende e promove o bem comum. Como o poder está vinculado ao bem das pessoas, a finalidade do poder implica na necessidade do consenso social. O consenso é justamente a aclamação constante do povo, a expressão popular que atesta que o exercício do poder atende ao bem do povo.

O mesmo vale para os postos de controle dos bens, para as posições da sociedade civil, que devem ser pautadas pela igualdade, pela mediania, sem grandes fortunas privadas, sem miséria, sem reificação. 

Da mesma forma, se os agentes públicos prejudicam o povo, prejudicando o bem da sociedade, esta pode depor estes agentes públicos ou mudar as formas positivas de poder, de Estado, de governo. Há inclusive o dever de participar da revoluções contra tiranias. 

A teoria mista, que adota o que há de comum nas duas teorias mais delineadas, foi esposada pela União Internacional de Estudos Sociais, de Malines, no “Código de Moral Política” (Santander, Ed. Sal Terrae, 1959, p. 29).

Trata-se de teoria democrática popular, que exige uma democracia popular, ligada aos interesses do povo, uma “politéia”, nos termos de Platão e Aristóteles (sendo também a opinião de Moisés), uma economia mista, um Estado social.

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