O ideal cristão judaico de autodomínio pessoal, familiar e social

A ética cristã nasce de uma síntese, de uma recapitulação entre o melhor da Revelação hebraica e da Tradição da humanidade, da Paidéia.

A teologia da libertação, um elo da Teologia Tradicional da Igreja, é baseada no ideal pessoal e social de “enkrateia” (virtude elogiada por São Pedro e por São Paulo, a “temperança”), de equilíbrio, medida, auto-controle pessoal e social.

Um ideal de autonomia e autodeterminação pessoal e social, pelo diálogo interno e entre as pessoas. O máximo de personalização com o máximo de socialização, sendo esta regra válida para a vida pessoal, familiar, econômica e estatal. 

Este ideal é referido na Bíblia com várias palavras, como “autodomínio”, “paz” (“shalom”), “liberdade” (“eleutheria”) etc.

Está na abertura dos Dez Mandamentos, quando o próprio Deus se identifica como “Libertador” do povo contra as opressões e em prol da autonomia humana e do povo.

São Pedro, ao descrever as virtudes que deve ter um cristão, em II Pd 1,5-7, destaca a “engkrateia”, o “auto-domínio”, a autonomia humana. São Paulo, em Gl 5,22-23, usa o mesmo termo “engkrateia”, autonomia, autocontrole, controle da pessoa sobre si mesmo, usando também o termo estóico “autarquia” (“autarkes”, cf. Hb 13,5; 1 Tm 6,8; 2 Co 9,8; Fp 4,11 e outras passagens).

Por extensão, uma sociedade bem estruturada, de acordo com a natureza humana, é a sociedade que tem controle sobre si mesmo, que tem autodeterminação, autonomia, controle social sobre o processo produtivo, sobre a gestão dos recursos para atender às necessidades e assegurar a todos uma vida simples, plena, abundante, feliz.

Lúcio Lactâncio (240-320 d.C.), um dos vários estóicos católicos, no livro “Instituições divinas” (VI, 8, 6-9), transcreveu um texto do livro “Da República” (III, 33), de Cícero, que explica claramente o papel da consciência, da razão, como fonte da edição de regras jurídicas e éticas de condutas pela razão humana, presente em todas as pessoas, para o bem de todos.

Há o mesmo ensinamento em São Clemente de Alexandria, em Santo Agostinho, em São Jerônimo, em São Máximo de Constantinopla e em todos os Doutores, Santos e grandes teólogos da Igreja Católica. 

A consciência é naturalmente legisladora, o povo é o legislador natural de si mesmo, por desígnio divino, por força da própria natureza, pela Lei do Criador, que nos criou para sermos co-criadores, co-gestores, co-reis, co-governantes, co-redentores, divinizados, pela união com o Deus da Vida plena.