A doutrina da Igreja defende a planificação participativa da economia, economia mista, com ampla intervenção social estatal

No Brasil, a Constituição de 1934 foi extremamente permeada da influência da Igreja. E previa uma forma de planejamento estatal participativa. Cada Ministério teria um Conselho Técnico Consultivo (como que Agências estatais), com a participação de agentes públicos e de representantes da sociedade (cf. art. 103). A Constituição brasileira de 1937, no art. 57, mesmo com erros absolutistas, previa a criação de um “Conselho da Economia Nacional”.

A linha da Igreja está presente também no governo de Arthur Bernardes, que combateu pela estatização do ferro, do aço, do petróleo, pela defesa da Amazônia e por outras estatais. E também está presente no governo de Epitácio, ao dar ênfase ao Nordeste, a parte mais pobre. 

Roberto Simonsen, com a ajuda do padre Roberto Sabóia de Medeiros (1905-1955), apresentou, em 1944, o projeto de criação de uma “Junta Nacional de Planificação”, buscando a “planificação da nova estruturação econômica”.

Roberto Simonsen (que faleceu em 1948) tinha, a seu lado, outro grande católico, San Thiago Dantas. Robert Simonsen não deve ser confundido com o pérfido entreguista Mário Henrique Simonsen, que era o oposto, lacaio do imperialismo. Roberto Simonsen era protecionista e nacionalista. Seguia as idéias de List e de Manoilesco, tal como os textos da CEPAL, sendo filiado ao PSD, tal como Barbosa Lima Sobrinho.

Lembro que Manoilesco cometeu erros crassos, inclusive de antissemitismo, mas redigiu textos a favor dos países oprimidos. Textos protecionistas e de intervenção estatal. O próprio Gramsci reconheceu que alguns fascistas da Itália tinham textos corretos sobre a necessidade de criar estatais e aumentar a intervenção estatal. É preciso separar o joio do trigo, ficando com o bom trigo, e rejeitando coisas sórdidas como o antissemitismo e apoio ao autoritarismo…

Destaco que a maior das correntes políticas entre os judeus (e o mesmo vale para católicos, luteranos, anglicanos, metodistas, ortodoxos e aos poucos para os muçulmanos) é o trabalhismo. Os grandes líderes judaicos eram trabalhistas, desde os tempos do Bund, trabalhistas e democráticos. Esta corrente ética política permeia o melhor do judaísmo, o melhor do catolicismo etc. Eu mesmo sou trabalhista roxo rs. 

O horrível Jacob Viner, ideólogo entreguista, atacava as teses de Manoilesco, para entregar a economia internacional aos trustes e cartéis, ao grande capital, ao capital financeiro, ao imperialismo. 

Em 24.05.1959, o II Encontro dos Bispos do Nordeste, em Natal, com a presença do núncio, o grande Dom Lombardi, aprovou declaração que requeria ao Presidente da República a reforma agrária e o planejamento público econômico para o desenvolvimento do Brasil, com ênfase nas partes mais pobres, como o Nordeste.

O livro de Roberto C. Simonsen, “O planejamento da economia brasileira” (São Paulo, Ind. Gráfica Siqueira, 1945) foi uma “réplica ao Sr. Eugênio Gudin (1886-1986), na Comissão de Planejamento Econômico” e até hoje pode envergonhar e refutar os liberais.

O livro de Simonsen, “História econômica do Brasil” teve o prefácio de Afrânio Peixoto, concunhado de Alceu Amoroso Lima. Peixoto foi divulgador dos textos de Maritain no Brasil, além de autor de boas obras literárias.

Outros expoentes ao lado de Roberto Simonsen, defendendo a planificação estatal, foram Euvaldo Lodi, Rômulo Berredo de Almeida ( candidato ao Senado, pelo MDB, em 1978, na Bahia) e outros. Rômulo fazia parte da Assessoria Econômica de Getúlio Vargas, contando também com Jesus Soares, o grande Maciel e outros.

Nesta mesma linha, houve, anos depois, homens como Severo Gomes (Luciano Coutinho ressaltou bem a influência de Severo na parte econômica da Constituição de 1988), Celso Furtado (seguindo as melhores idéias da CEPAL), Humberto Bastos, Djacir Menezes, Hamilton Prado e outros grandes economistas, que defenderam um órgão de planejamento estatal da economia, ampliação do poder regulamentador do Estado etc.

Outros nomes dignos de lembrança e respeito são: o general Eunápio Gomes, Agamennon Magalhães, Sérgio Magalhães, o general Lott e há milhares de outros. Destaco Osny Duarte Pereira, que elogiava Pio XI, a lição deste Papa, na “Quadragesimo anno” (1931): os bens econômicos muito grandes e que atribuem grande poder devem ser estatais ou sociais (cooperativas), e não privados. Boa lição, de economia mista, de planificação participativa.

O projeto da “Lei Malaia”, de Agamennon, é ainda hiper atual e necessária. Sérgio Magalhães apenas deu continuidade as lições de seu tio, Agamenon, getulista histórico. O General Lott foi outro grande nome, o candidato da esquerda nas eleições de 1960, em quem eu teria votado, se estivesse vivo naquela época. 

O Conselho Nacional de Economia foi introduzido por proposta do então deputado Daniel Faraco (n. 1911), católico, ligado ao padre Leonel Franca. O Conselho, no entanto, por influência liberal, teve uma composição péssima, pois o horrível Octávio Gouvêa de Bulhões, representante dos interesses do capital internacional espoliador, foi seu presidente de 1953 a 1954. Era meramente consultivo, enviando exposições ao Presidente e ao Congresso. Existia até a “Revista do Conselho Nacional de Economia”.

O terrível Eugênio Gudin destilava seu ódio contra as formas de planejamento estatal. Mais tarde, Gudin foi substituído por Roberto Campos (“Bob Fields”) e outras pragas neoliberais.

O Segundo Governo de Getúlio teve que ser uma coligação partidária, e tinha boas pessoas (especialmente João Goulart) e péssimas pessoas. Coligações são males menores, que às vezes são necessárias, exigindo discernimento, da parte boa e da parte má. 

No final dos anos 50, no Brasil, com Getúlio e Juscelino, dois grandes católicos, houve o grupo do ISEB, unindo grandes católicos, nacionalistas e marxistas. Basta citar nomes como Cândido Mendes, Roland Corbisier (elogiado por Alceu), Vieira Pinto (misto de católico e marxista), Guerreiro Ramos, Rangel e Nélson Werneck Sodré. Foi graças a este grupo e outros que Celso Furtado pode fundar a SUDENE, com total apoio dos bispos brasileiros. Guerreiro Ramos e Rangel, depois, pioram. Cândido manteve a linha, embora seus textos sejam difíceis, por causa do vocabulário chato (a César, o que é de César….). 

A ligação do catolicismo com o nacionalismo fica claro na candidatura do general Lott, um grande católico, em 1960, pelo PTB, com o apoio do próprio PCB.

Esta ligação fica bem evidenciada no livro “Nacionalismo e Desenvolvimento”, de Cândido Mendes ou na obra “Nação e nacionalismo”, do padre José Comblin, obras editadas pela Editora Duas Cidades, dos dominicanos. A Livraria e Editora Duas Cidades, no centro do Rio de Janeiro, foi criada em 1954, por Frei Benvenuto. Esta livraria era tão nacionalista que foi um dos elos entre os Dominicanos e Carlos Mariguella. A editora lançou os livros de Antônio Cândido, católico e socialista (tal como Alceu, Pontes de Miranda, Sérgio Buarque de Holanda e outros grandes católicos e o próprio Dom Hélder Câmara, ou Frei Betto, ou Barbosa Lima Sobrinho).

Vale à pena recordar também o livro de Roberto Lyra, “O socialismo para o Brasil, cristianismo, nacionalismo e democracia” (Ed. Civilização Brasileira, 1962). Lyra era católico, nacionalista, trabalhista, e ainda adotava o melhor do positivismo, a parte boa do positivismo em boa adequação com o catolicismo. 

O golpe de 64 eliminou o antigo Conselho Nacional de Economia, previsto na Constituição de 1946, e entregou nossa economia e nosso Estado para o imperialismo (com horrendos, pérfidos, grotescos testas-de-ferro como Roberto Campos).

Para defender o golpe de 64, era preciso não ter escrúpulos na consciência, não ter consciência ética, ponto que Jarbas Passarinho e Delfim ilustram, pois pisaram a ética social para entregar nossa economia ao caos neoliberal. O golpe de 2016 teve a mesma linha neoliberal, de entreguismo, ódio à Previdência, ódio às estatais, ao direito trabalhista, aos índios, aos negros, aos pobres, aos trabalhadores, às mulheres etc. O neoliberalismo é algo horrendo.