A síntese do Padre Charles Antoine, no livro “Curso de economia social”, muito lido e acatado

O padre jesuíta Charles Antoine escreveu uma obra importante chamada “Curso de economia social”, que foi elogiada por um dos principais teóricos cooperativistas, Charles Gide. Gide é considerado o principal teórico cooperativista e defendia um socialismo cooperativista, desenvolvendo idéias de Buchez, Lamennais, Owen, Fourier e outros socialistas cristãos, tal como as idéias dos cooperativistas de Rochdale, de 1844. Buchez é bem anterior.

Antoine expôs, num bom texto, o que chamou de “movimento democrático universal”, do qual a democracia liberal e o socialismo são apenas “etapas”.

Antoine concordava com vários “remédios propostos pela escola socialista”, como, “por exemplo, as resoluções do Congresso Socialista de Marselha, de setembro de 1892”, que pediam mais democracia e medidas de “proteção das mulheres e dos meninos, a regulamentação do trabalho da noite”, a ampliação da legislação do trabalho etc, tal como o combate à “especulação”, aos “monopólios e açambarcamentos”. A conclusão de Antoine era clara: “não podemos deixar de aprovar estas medidas”.

Mais adiante, Antoine, com base num texto de Leão XIII, destaca “a existência de um movimento democrático universal”:

“… é preciso ter em conta um fato importante: a existência de um movimento democrático universal. Discuta-se o que se queira, a etimologia, o valor, a conveniência e a oportunidade da palavra democracia, não por isso deixa de ser menos certo o fato desse movimento democrático universal, afirmado nestes mesmos termos pelo Santo Padre a Monsenhor Doutrelox (Bispo de Liége, Carta Pastoral, 14-02-1894, p. 21)”.

O “movimento socialista” foi considerado corretamente, pelo padre Antoine, como um capítulo do “movimento democrático e operário”. Os tipos concretos de propostas socialistas tinham erros (desprezo da pessoa e da liberdade) e boas idéias, mas o ponto essencial é que “o movimento democrático e operário” era benéfico, tendo idéias corretas, em meio a idéias erradas como o anticlericalismo:

“Graças a esta confusão, operário honrados e bons, que de maneira alguma participam das doutrinas coletivistas, se unem, no entanto, ao partido socialista operário, para fazer com que triunfem as reivindicações operárias que consideram justas”. “O movimento operário é a conseqüência da evolução social e da transformação econômica do mundo moderno”.

Esta é a mesma opinião expressa por Alceu Amoroso Lima, quando, em várias obras, descreveu o movimento de democratização que deve atingir o processo produtivo, social, cultural etc.

Alceu defendeu a fórmula distributista para superar o capitalismo liberal e o estatal, pugnando pela difusão da democracia nas relações produtivas (através de boas estatais, formas de co-gestão, de autogestão e de planejamento participativo) e no Estado. Alceu queria uma Democracia popular, um socialismo de economia mista, participativo, democrático, popular. 

João XXIII, na “Mater et magistra”, também descreveu o movimento de ascensão dos trabalhadores (tal como das mulheres e das nações do terceiro mundo), já antes referido pelo padre Charles Antoine, com base nos textos de Leão XIII.

O socialismo mencionado de forma crítica pelo padre Antoine era o socialismo mesclado com atéismo e ditaduras. O próprio Antoine reconheceu as idéias e as reivindicações corretas do movimento operário e do movimento socialista.

Pio XI, na “Quadragesimo anno”, também ressaltou a convergência histórica entre catolicismo e socialismo democrático, destacando inclusive a tese comum da estatização dos meios de produção e dos recursos cujo controle propiciasse excesso de poder. Há a mesma constatação nos textos de João XXIII e de Paulo VI. Neste sentido, Leônidas de Rezende – em obras da década de 50, do século passado – também demonstrou a convergência entre socialistas, positivistas e católicos.

O Desembargador Osny Duarte Pereira (no prefácio de seu livro sobre o ferro e a indústria siderúrgica) também elogiou Pio XI por este papa ter defendido a estatização e a socialização dos bens materiais que atribuíam um poder excessivo aos particulares.

Conclusão: há uma linha (plano) histórica e evolutiva (providencial, pela mediação da liberdade humana) no movimento histórico da humanidade. É um movimento de democratização, de ascensão do homem comum, do trabalhador, dos “humildes” e “pobres”, como está claro no cântico de Maria.

O movimento democrático (na esfera política, econômica, cultural, educacional, das comunicações, étnico etc) visa à superação do liberalismo (de abolição do latifúndio e das grandes fortunas privadas), em prol de uma democracia popular e participativa, ou seja, instaurar e criar formas de socialismo humanista, participativo e democrático compatíveis com o “movimento democrático universal” (cf. Marciano Vidal).

O movimento democrático atinge todas as nações, pois nasce do movimento consciente das pessoas em busca de libertações, da luta consciente contra todas as formas de opressão. Neste sentido, a consciência é elástica, as provações tendem à purificação, à melhoria do ser humano.