Lista parcial das virtudes e afetos, elogiados pela Igreja

São Paulo, na “Carta aos Gálatas” (5,14), repete o ensinamento de Cristo, e resume toda a ética cristã: “toda a lei se resume em um só preceito, a saber: amarás o teu próximo como a ti mesmo” (5,4). Um ponto peculiar da ética cristã é relacionar todas as virtudes ao amor (cf. Gl 5,22; Ef 4,32 e 5,2; Cl 3,12; e outros trechos).

As principais listas de virtudes estão em Gl 5,19-23; Fp 4,8; Cl 3,5 e 12; 2 Co 12,20; Tt 3,3; 1 Tm 3,1-13; e outras passagens. Estas listas coincidem, em linhas gerais, com as listas vétero-testamentárias (do Antigo Testamento), tal como do estoicismo, do platonismo e do aristotelismo. Também há pontos comuns com os Rolos do Mar Morto. Autores como A. Vogtle (“Die Tugende und Lasterkataloge um Neuen Testament”, 1936) tentaram demonstrar a influência estóica nestas listas. Possivelmente exista também influência do mitraísmo (cf. S. Wibbing, “Die Tugend”, 1959). No fundo, esta lista estava no melhor dos textos hebreus e fenícios, estando nos textos hititas, sumérios, daí, a lista foi para os persas, acolhida no mitraísmo. E deste complexo, especialmente partindo dos fenícios, influenciou e criou o estoicismo, filosofia nascida de autores de origem fenícia (o fundador do estoicismo era fenício, tal como os maiores expositores). 

Na “Carta aos Gálatas” (2,4), diz que os cristãos “crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências” desordenadas, no sentido estóico, de afetos sem a ordenação racional, pois os afetos racionais são coisas boas e apreciadas pelos estóicos, ponto que desenvolverei em outra postagem. 

A lista das virtudes, no texto da “Carta aos Gálatas” (5,22-23), é a seguinte, formando os nove frutos do Espírito:

1) amor é “ágape”, em grego. Significa “caridade”, que é principal virtude (vide Primeira Carta aos Coríntios, 13,4 e, principalmente, I Cor 13,13, o “Hino ao amor”). É a mesma lição da Primeira carta de São João (4,7), que ensina que o amor é a primeira das virtudes e é eterno. Caridade em relação ao próximo é misericórdia, que é preocupar-se com o atendimento das necessidades do próximo (cf. explicação de Santo Tomás de Aquino, na “Suma Teológica”), preocupar-se com o bem do outro, com o bem comum. O amor é também a principal emoção humana. 

2) alegria é “chara”, em grego. Vem do verbo “chairo”, significa alegrar-se com o bem. A Septuaginta usado também a palavra grega “agalliasis”. Em hebraico, “alegria” é “simhah”, do verbo “saimeah”. Deus é um Ser alegre (cf. Sl 16,11; Fp 4,4; e Rm 15,13). São Pedro frisa que o cristão deve ser uma pessoa alegre (cf. 1 Pd 1,8). Neemias ensina: “a alegria do Senhor é a nossa força” (cf. Ne 8,10). A “tristeza” (“lype”, em grego) é um vício, uma paixão desordenada. Os estóicos aconselhavam, na mesma linha: “foge da tristeza” (cf. Periandro, “Sentenças”, 56);

3) paz é “eirene”, em grego. Daí, “pacificador” (“eire”opoieo”), pessoa pacífica. Há referência também em Isaías 45,7. Cristo ensinou: “aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração” (cf Mt 11,29). Em hebraico, “paz” é “shalom”, que significa bem estar no sentido pleno, prosperidade, felicidade etc.;

4) paciência é “makrothymia”, em grego. Significa “longanimidade”, “paciência”, “constãncia”, “perserança”). Trata-se de virtude elogiada em vários textos como: 1 Cor. 13:4-7; 2 Cor. 6:4-6; Ephes. 4:1-2; Col. 1:11; Col. 3:12-13; 1 Tim. 1:16; 2 Tim. 3:10; e 2 Tim. 4:2. Em hebraico, “paciência” é “arekh”. A Bíblia elogia a paciência de Deus (cf. Ex 34,6; Nm 14,18; Ne 9,17), que é “longo” em irar-se. Daí, o termo “longanimidade”. Deus é lento em irar-se ao tratar com os pecadores (cf. Os 11,8; e Is 48,9). Os cristãos devem imitar a Deus na paciência ao irar-se (cf. Mt 18,26; I Co 13,4; Gl 5,22; Ef 4,2; e 1Ts 5,14);

5) gentileza (“chrestotes”, em grego), elogiada em textos como: 2 Tim. 2:24-26; Tt 3:1-2; e Tiago 3:17;

6) bondade (“agathosune”, em grego), elogiada em textos como: Ex 33:19; Ex 34:6; Rm 2:4; Ef 5:9; Mt 5:44-48; e Lc 6:27-32. A “Septuaginta” usou o termo “agathos” para traduzir a palavra hebraica “tov”, “bom”. O termo “tov” significa “bom”, “alegre”, “agradável” etc. A “Septuaginta” usa o termo “kalos” também, que significa “belo” (“admirável”, “digno”, “honroso”). São Paulo também usa o termo “chrestotes” (cf. Rm 2,4; 11,22). O termo hebraico “hessed” também significa “bondade”, “compassivo”, “misericordioso”, “benigno”, “amoroso”;

7) fidelidade (“pistis”, em grego). Sobre a fidelidade, há um bom texto de Karl Barth, “Fidelidade na comunhão”;

8) modéstia (“praotes”, em grego); e

9.Temperança (“engkrateia”, em grego, autocontrole). Virtude elogiada em textos como: Prov 23:1-3; Prov 25:16; Dan 1:8-16; Rm 13:14; 2 Cor. 9:25-27; Fil 4:5; 1 Tes. 5:6-8; Tt 2:2-3,11-12; 2 Pt 1:5-10. Está expresso nos “Dez Mandamentos”, com o preceito “não cobiçar”.

Como fica claro, as virtudes morais são afetos (emoções, paixões, correlatas a ideias) bem ordenados por idéias práticas do bem, ou seja, pela razão, em prol do bem comum. O ponto central em todas as virtudes é que são práticas do bem, como destacou Santo Tomás de Aquino.