A concepção cristã sobre o poder, de Thomas Jefferson e de Dewey

Os grandes teóricos da democracia foram pessoas cristãs, que usaram as fontes humanas do cristianismo, o melhor da Paidéia e a tradição semita-hebraica bíblica. Para ilustrar isso, basta ver o caso de Thomas Jefferson.

Carl L. Becker, no livro “A Declaração da Independência” (São Paulo, Editora IBR”SA, 1964, p. 17), explicita as fontes teóricas católicas e tradicionais de Thomas Jefferson. A mesma explicação está no livro de John Dewey, “O pensamento vivo de Jefferson” (São Paulo, Ed. Martins, 1952, p. 25). As fontes das ideias de Jefferson são fontes tradicionais, católicas, do “common law”, da “Carta Magna” católica, quando o Reino Unido era católico, em 1215, etc.

Thomas Jefferson disse que não inovara nada. Apenas tinha exposto, na “Declaração da Independência”, as ideias dos Whigs, na Inglaterra. Estas ideias eram baseadas no “senso comum”, nas ideias práticas do povo, nos ideais democráticos católicos que geraram a “Carta Magna”, em 1215, quando a Inglaterra era toda católica.

As melhores ideias de Thomas Jefferson e dos Whigs eram as idéias de “Aristóteles, Cícero, Locke, Sidney” e outros, especialmente as ideias democráticas de Aristóteles e Cícero, acolhidas pela Tradição da Igreja, pela cultura medieval, na Europa e na Ásia ocidental.

John Dewey completa o texto de Jefferson, destacando que as ideias democráticas são bem anteriores a Jefferson, pois estavam expostas nos autores citados por Jefferson, tal como estavam em Puffendorf e também na “filosofia política dos Padres da Igreja” (p. 25, do texto de John Dewey, sobre Thomas Jefferson).

O depoimento sobre a tradicionalidade da doutrina popular sobre o poder na seara da Igreja é, assim, de John Dewey, que destaca a “filosofia política dos Padres da Igreja”.

Além de Dewey, autor especialista em Jefferson, há também algo melhor ainda, que é a confissão e o reconhecimento do próprio Jefferson. Vejamos trechos da carta de Thomas Jefferson, no final da vida, sobre as fontes teóricas de seus textos:

[Era essencial] “Não descobrir novos princípios ou novos argumentos de que ninguém se tivesse lembrado antes, nem dizer simplesmente o que nunca se dissera antes; mas colocar perante os homens o senso comum da questão em termos tão claros e firmes que lhes merecessem o assentimento. (…). Toda a sua autoridade [da “Declaração da Independência dos EUA] baseia-se nas opiniões harmonizadas da ocasião, expressas em conversas, cartas, ensaios impressos, livros elementares de direito público, como Aristóteles, Cícero, Locke, Sidney, etc”.

Thomas Jefferson baseou-se nas ideias anglicanas de sua época, ideias católicas, no fundo. Eram as mesmas ideias já recepcionadas pela Igreja, desde o início. As melhores idéias da Paidéia coincidiam com a Tradição democrática hebraica e estas duas fontes foram a base humana do cristianismo.

Thomas Jefferson apenas reproduziu e acolheu “as opiniões harmonizadas” do povo inglês, anglicano, colhidas da Igreja Católicas. Estas ideias estavam, nas palavras de Jefferson, “expressas em conversas, cartas, ensaios impressos, livros elementares de direito público, como Aristóteles, Cícero, Locke, Sidney” e outros.

Jefferson apenas reproduziu as ideias democráticas presentes na Tradição da Igreja, difusa na Europa, presentes no ideário anglicano-católico de sua época. Os textos de Aristóteles e de Cícero foram protegidos e difundidos pela Igreja Católica. Locke e Sidney são também elos de transmissão da teoria política democrática dos Santos Padres, do Evangelho, da Igreja.

A Igreja sempre lutou por uma “Cidade dos homens” em adequação à “Cidade de Deus”, como explicou Santo Agostinho. Uma “Cidade” humana pautada pelas ideias do povo, pela mediania, pelas ideias do homem do povo, ponto bem frisado por Chesterton.

O “Reino de Deus” na terra é uma República, pois Deus habita em cada pessoa e a forma de Deus governar é pelo diálogo com o povo. Assim, para Deus governar a sociedade esta deve autogovernar-se. Deus nunca tira a independência pessoal, familiar e social, e sim a reforça. Deus é a garantia e o apoio para a libertação pessoal, familiar e social.

Toda a ética cristã produz uma sociedade regida pela paz, pelo diálogo. O ideal cristão é o ideal de um governo pacífico, movido pelo diálogo. É o ideal de uma “Politéia”, de uma Cidade Humana, à imagem da Cidade Divina, nos termos de Santo Agostinho.

Conclusão: o Evangelho gera, pela atuação dentro das almas, uma Comunhão humana, extensão da Comunhão Divina, da República divina. Como apontou Paulo VI, a Igreja luta por uma nova democracia real, popular, baseada na participação de todos no poder, fonte essencial do bem comum.